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domingo, 6 de novembro de 2011

HOMILIA 06/11/2011

Todos os Santos

Celebramos a festa de todos os santos e somos levados primeiramente a adorar a Santidade única de nosso Deus! Só Deus é plenamente Santo, o três vezes santo!
Estamos chegando ao final de nosso ano litúrgico e somos convocados a meditar sobre as realidades finais que chamamos de escatologia, enquanto nos preparamos para a festa de Cristo Rei onde contemplamos o final dos tempos, e a restauração de tudo em Jesus. Deste modo somos levados a recordar nossos irmãos falecidos, a refletir sobre o julgamento divino e sobre a santidade. Assim hoje, devemos nos encher de alegria com muitos irmãos nossos que estão na glória celeste!
A celebração de hoje não é uma somatória dos santos canonizados, estes nos foram colocados como exemplo de vida. Como dizia santo Agostinho, ao contemplar os inúmeros mártires: “Se eles e elas puderam, por que eu não posso?”.  Hoje não celebramos também a festa do “Santo desconhecido” aos moldes das comemorações do “soldado desconhecido”. Hoje comemoramos todos os santos, isto é, todos os que estão na glória de Deus.

A primeira leitura (Ap. 7,2-4. 9-14) tirada do Apocalipse nos aponta a realidade da multidão dos santos diante do Altíssimo. Primeiro encontramos um número simbólico (cento e quarenta e quatro mil ou 12 x 12 x 1000) indicando a totalidade da comunidade cristã. Depois uma multidão imensa que ninguém conseguia contar, indicando a humanidade toda. Aqui temos um eco da promessa de Deus feita a Abraão, de que sua posteridade seria mais numerosa que as estrelas do céu ou as areias dos mares (Gn. 15,5).
 Muitos também que não conheceram Jesus e que não aderiram externamente a fé, mas que viveram os valores do Evangelho praticando o amor e a justiça, estão vitoriosos diante do Cordeiro.  Diz o texto que vieram da “grande tribulação”, isto não se refere apenas ao fim do mundo, mas aos sofrimentos da vida.  Eles enfrentaram as dificuldades do dia a dia, pareciam perdedores, mas foram vitoriosos no Sangue de Jesus.
Alguns pormenores são bem interessantes: o anjo que intervém para subtrair os homens do castigo vem do nascer do sol. Os israelitas esperavam a salvação que como o sol nascia no oriente (Ez. 43,2). A intervenção do anjo recorda a ação sempre gratuita de Deus que visa a salvação dos homens. Deste modo quando os cristãos sentem mais fortemente as provações, também percebem a presença de Cristo que os salva e os guarda (Ap. 3,10).
Também encontramos o simbolismo da marca ou selo de Deus, que nos remete a Ezequiel (Ez. 9,4) onde os homens de Deus são marcados com um “tau”, isto é, com uma letra muito semelhante a cruz. Deste modo podemos entender esta marca de Deus sobre a fronte das pessoas como o sinal de que elas lhe pertencem pelo batismo. De fato no batismo somos marcados na fronte com o sinal da cruz, e com o banho da água recebemos a vida da graça. Assim podemos compreender que os marcados por Deus são todos os cristãos. E estes estão com a veste branca, sinal de que foram purificados e reconciliados com Deus, por Jesus o Cordeiro imolado e glorificado. Também trazem nas mãos palmas que indicam a vitória sobre a tribulação (1Mc. 13,51).
A cena do apocalipse afirma que os homens são admitidos diante de Deus, e lá se realiza o culto celeste, de modo que de fato estamos diante de um povo sacerdotal.
Sem dúvida alguma a salvação pertence a Deus e nos vem através de Jesus Cristo, nosso salvador. É através de Jesus e de seu mistério pascal que recebemos gratuitamente a possibilidade de participarmos da vida de Deus, da vida sobrenatural. É de fato no sangue do cordeiro que fomos resgatados. E nunca podemos nos esquecer de que Deus deseja salvar a todos os homens.
Assim, o que hoje celebramos é a vitória definitiva sobre o mal, a dor e a morte de todos os resgatados pelo amor misericordioso de Deus. Olhar para a Jerusalém celeste deve encher-nos de esperança, cumular-nos de forças enquanto peregrinamos neste vale de lágrimas, e estamos enfrentando a “grande tribulação”. É sempre necessário manter a certeza de fé na vitória, mesmo quando tudo a nossa volta aponta para a derrota!
Poderíamos agora nos perguntar seriamente:
• Cremos que Deus oferece a todos a salvação?
• Como vai nossa esperança diante dos sofrimentos e provações?
• Vivemos de fato nosso ser de batizados trajando a veste branca de uma vida nova?
• Esperamos verdadeiramente a vitória definitiva do bem?

A segunda leitura (1Jo 3,1-3)  nos aponta o grande presente que é a vida da graça que recebemos. Somos de fato filhos de Deus, mas ainda não podemos perceber bem isto. Só compreendemos esta realidade na penumbra da fé, pois vivemos como filhos, mas isto não se manifesta claramente e nem pode ser visto com nossos olhos humanos. Mesmo assim, esta vida divina, presente gratuito de Deus, pode ser percebida pelos sinais concretos nas ações das pessoas que buscam sinceramente a Deus. Esta vida da graça, esta participação na vida divina, este novo ser, não nos é comunicado após nossa morte, mas nos é dado ainda nesta vida.  E será esta mesma vida que na eternidade se tornará plena!  Hoje celebramos nossos irmãos que estão na plenitude da vida.
A vida de Deus que participamos nos foi dado em nosso batismo, e para que ela cresça necessitamos sempre de agir com fé, esperança e caridade. A busca de crescer na vida da graça deveria ser o ideal de todo cristão. Nunca podemos nos esquecer de que a oração é um dos mais eficazes meios para crescermos em nossa vida sobrenatural.  Esta vida de participação na vida divina leva a pessoa a uma abertura sempre maior aos seus irmãos. Deste modo quem se esforça para ser todo de Deus, também vive como todo para os irmãos, numa atitude de partilha e serviço gratuito.
 Como disse Jesus: Deus é o Deus dos vivos e não o Deus dos mortos, e hoje lembramos que lá no céu junto do autor e Senhor da vida temos muitíssimos irmãos vivendo plenamente, e intercedendo por nós.
Será que:
• Buscamos de fato viver na graça de Deus?
• Somos abertos e disponíveis aos irmãos?
• Nos preocupamos em crescer numa vida de intimidade com Deus?
• Somos mesmo filhos de Deus em nossa vida prática?

O Evangelho (Mt. 5,1-12) das bem-aventuranças, no auxiliará na compreensão do caminho para a santidade. Jesus está no monte, lugar bíblico das grandes experiências do Povo com seu Deus. Ali ele está sentado, como o mestre que ensina solenemente a seus discípulos e sua palavra mostra profunda autoridade.
Jesus usa a palavra “bem-aventurado” o que indica felicitação ou congratulação, sentido já bem conhecido no Antigo Testamento.  Mas como entender que felizes são os pobres, os aflitos, os perseguidos, que lógica é esta? Será que Deus deseja o sofrimento aqui na terra para depois dar como recompensa a glória na eternidade? Esta seria uma imagem correta do Pai misericordioso que Jesus não cessa de nos apresentar?
Seriam os pobres melhores que os outros, ou mais disponíveis a Deus, só porque são pobres? É claro que Jesus não assume esta perspectiva errônea e moralista.
É bom lembramo-nos da mentalidade Oriental da época, inclusive da judaica, de que o Rei deveria estar principalmente ao lado dos mais fracos, daqueles que não tinham nenhuma influência social e política, dos que não tinham ninguém por si. Mas, também vemos na história de Israel que isto ficou apenas no ideal, muitos reis, foram cruéis e só pensavam em si.  Tudo isto cria uma esperança na intervenção de Javé com a vinda de um Rei justo e misericordioso para com os mais necessitados. Jesus é o pleno cumprimento desta esperança, ele vem para dar vida plena a todos e uma vida não só na eternidade, mas a partir desta terra.
Agora podemos entender porque Jesus proclama felizes os pobres e aflitos? É porque chegou a instauração do Reino, Deus resolveu intervir em favor dos sofredores e libertá-los. Deus vem para retirá-los das condições desumanas de vida, seja da miséria, ou mesmo dos diversos preconceitos que os excluíam da religião e da sociedade daquela época. Leprosos, estrangeiros, pecadores tidos como públicos, cegos de nascença, doentes, pobres, todos podem contar com a ação salvífica de Deus. Assim, o ensinamento do Senhor não é um ópio alienante para o povo como alguns afirmavam. Cristo não aponta como ideal a resignação com o sofrimento esperando a recompensa na eternidade, mas vida e uma mudança radical da realidade. Trata-se de buscar um mundo como Deus o deseja. O ideal de vida não é a miséria, e nem os miseráveis são mais santos que os outros só por serem miseráveis, o desejo de Deus é que todos possam ter vida digna.
Compreendido este núcleo essencial, entenderemos que as bem-aventuranças nos apontam atitudes de vida para a construção do Reino de Deus. Reino que caminha na dialética do, já e do ainda não. O Reino já está presente no mundo, mas ainda não plenamente. Por isto que diante deste Reino, o ser humano não pode estar indiferente, precisa mudar de vida.  E ainda mais, tem o ser humano a necessidade de ser instrumento de implantação e crescimento deste Reinado de Deus.
Vejamos rapidamente as propostas do Senhor:
Felizes os “pobres em espírito” trata-se dos humildes, daqueles que não se fiam na auto-suficiência, mas apresentam-se diante de Deus com as mãos vazias. Sabem que são necessitados de tudo, e carentes de Deus!  É a atitude daquele que percebe que tudo é graça de Deus e que somos sempre seus devedores. Atitude vivida de modo exemplar pela Mãe de Jesus, a serva do Senhor!  Sem esta atitude não se pode entrar no Reino de Deus! Por isto esta bem-aventurança é a fundamental. A seguinte que fala dos “aflitos”, os que sofrem neste mundo dominado ainda pelas forças do mal e da morte, nos leva a agir como os profetas e como Jesus: ser consolo, força e ânimo para que não desanimem (Is. 62,1-2).
Ainda é feliz quem é “manso”, não se trata de ser tonto aceitando tudo e nada criticando ou buscando mudar! Trata-se daqueles que nunca recorrem a violência para resolver os problemas. Existem outros métodos de solução bem mais eficazes. Quem é manso constrói um relacionamento com seu próximo de não-violência, e apresenta-se diante dos demais desarmado de qualquer tipo de couraça (Mt. 11,29; 21,5).
Felizes os que “tem fome e sede de justiça”, fome e sede são as necessidades mais fundamentais de nossa vida. Assim é feliz quem tem como prioridade de vida a busca da justiça, mas não de qualquer justiça, mas da justiça divina! Para nós fazer justiça é apenas castigar os culpados. Para Deus justiça é tornar justo o que errou. Felizes são aqueles que procuram e se engajam em fazer a vontade de Deus.
Felizes “os misericordiosos”, isto é, aqueles que tem verdadeira compaixão dos outros. Colocam se no lugar dos irmãos (compaixão = sentir com) e os ajudam concretamente. Os misericordiosos perdoam os que erram (Mt. 18,33), e também realizam diversas obras de misericórdia em favor dos seus semelhantes, e em especial dos mais necessitados (Mt. 25,35-37). São ações concretas que minoram, aliviam ou resolvem os problemas dos demais.
Felizes os “puros de coração”, aqui não se trata da pureza ritual tão apreciada pelos judeus e nem mesmo da pureza corporal, mas da pureza do coração, que é a capacidade de ver com os olhos de Deus as pessoas e a realidade. Puro é não ser alguém que vê em tudo falsidade, engano, dolo, mentira, etc. numa palavra, é ser simples (Sl. 24,3-4).
Felizes os “que promovem a paz”, isto é, aqueles que trabalham pela verdadeira paz entre as pessoas, grupos e nações. Paz que não é ausência apenas de guerra, mas um relacionamento bom e construtivo! São os que ajudam as pessoas a perdoar, os que buscam a reconciliação, os que detestam a guerra (Sl. 34,15).
Finalmente felizes os que “são perseguidos” ou por causa da justiça ou por causa do nome de Jesus!  Este ensinamento do Mestre aponta para as dificuldades que seus verdadeiros discípulos encontrarão. Para se manter fiel ao Evangelho o cristão enfrentará sempre sofrimentos e perseguições. A final o discípulo não é maior que o Mestre, não é verdade? (Mt. 10,16-15) Jesus nos dizia que se fizeram isto ao lenho verde, que é Ele, que farão ao ramo seco que somos nós? (Lc. 23,31) Mas quem sofre pela justiça ou pelo Cristo é feliz, pois não está só! A força vem sempre do Senhor, e a esperança da vitória também. Jesus venceu e com ele venceremos também, assim aconteceu na vida de tantos irmãos nossos que hoje celebramos na glória do céu. Eles optaram pelas bem-aventuranças, viveram o Evangelho, sofreram muito, pareciam derrotados, e hoje estão com a palma da vitória diante do Cordeiro na liturgia celeste.
Poderíamos dizer que infelizes são os que só tem os olhos deste mundo e que apostam no mal, no egoísmo, na guerra, na falta de perdão, e etc. estes sim são verdadeiros infelizes já mesmo nesta vida.
Celebramos a festa de todos os santos e somos levados primeiramente a adorar a Santidade única de nosso Deus! Só Deus é plenamente Santo, o três vezes santo! Toda santidade provém dele, ele é a fonte de santidade. Tudo que é de Deus é santo, assim nos mostra a Escritura Sagrada: o templo é santo porque é de Deus, o povo é santo por que é dele. Os homens todos são chamados a participarem da infinita santidade de Deus. E deste modo cada um, de acordo com sua personalidade e capacidade, realiza um aspecto desta santidade divina. Uns, brilham mais na misericórdia, outros no trabalho pela paz, outros na vida interior de oração, outros no serviço apostólico, outros na educação dos menores, outros na promoção da saúde, etc. De modo que se olhamos o conjunto dos santos teremos uma pálida idéia da santidade divina.
Com isto, não estamos diminuindo a resposta humana, mas afirmando a necessidade de nos sentirmos todos chamados a santidade, que nada mais é do que viver a vida divina que recebemos em nosso batismo. Ser santo não é fazer milagres em vida, ou ter um comportamento exótico, mas viver plenamente o Evangelho do Senhor no dia a dia de nossa vida, e no meio de nossas tribulações apostarmos nos valores do Reino.
Que esta festa eleve nosso ânimo, nos ajudando a assumir as atitudes que o Senhor nos recomenda no Sermão da Montanha.  Pés firmes nesta terra construindo o Reino, mas com os olhos voltados para o alto a meta definitiva. Que o olhar para a Jerusalém celeste, nos anime e conforte nos embates duros da vida e nos ajude a perseverar em nossa caminhada cristã.
Ainda nos lembremos hoje de tantos irmãos conhecidos nossos, amigos, benfeitores, professores, parentes, que já estão na glória de Deus.  Eles estão diante de Deus torcendo e rezando por nós. São exemplo de vida e vitória a nos encorajar em nossa caminhada.
Podemos pedir que os santos intercedam, ou orem por nós? Claro que sim! Se, temos confiança na oração de nossos irmãos que conosco caminham, devemos ter maior confiança nos que já estão diante de Deus. Se, pedimos muitas vezes aos outros, que rezem por nós, e confiamos nesta oração, por que não podemos pedir aos que estão junto de Deus? Afinal em todos os domingos, professamos: “creio na comunhão dos santos”. O que isto quer dizer?  É claro que nos aponta a união e a partilha de bens entre todos os que estão em Deus, os que peregrinam nesta terra e os que já estão na glória do céu!
Que nesta semana, tomemos o sermão da montanha e nos perguntemos seriamente se estamos trilhando os caminhos indicados pelo Senhor. Será que nossas atitudes estão contribuindo para que o Reino de Deus cresça neste mundo. Para isto seria muito oportuno usar o texto das bem-aventuranças como base de um profundo exame de consciência.
E jamais nos esqueçamos do grande convite do Senhor: Sede santos como o meu Pai é santo! (Mt. 5,48)
Que possamos ainda crescer na virtude da esperança, nunca desanimando diante dos desafios e dos sofrimentos, fundados na certeza de que Deus nos ama e que com ele venceremos!
Peçamos ainda que todos os santos intercedam a Deus por nós, para que possamos viver plenamente nossa vida cristã sendo fiéis ao Evangelho, e que possamos ser instrumentos eficazes para o crescimento do Reino de Deus nesta terra.

padre Antonio Heggendorn CP.

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