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segunda-feira, 31 de março de 2014

Correio MFC Brasil #355


As palavras desejam pousar. Querem fazer-se passar pela metamorfose das ações humanas. Elas movem o mundo, movem as pessoas, movem os professores e as escolas. Neste movimento das palavras, enriquecem-se os conceitos e os ideais de vida, de mundo e de humanidade.

Saber sem conviver?

Nei Alberto Pies*

Prazer maior não há do que compartilhar conquistas de um saber aprendido e apreendido, onde protagonizam educadores e educandos. O prazer maior nas relações de ensino-aprendizagem está na construção do conhecimento como algo útil, agradável e capaz de desencadear alegria e realização. Afinal de contas, para que serve o conhecimento senão para a felicidade?

Viver para a dignidade parece ser a razão maior de nossas vidas. Mas a dignidade humana só será conquistada por cada ser humano quando cada um e cada uma compreender sua condição de sujeito de direitos e for protagonista de sua história. É o que também podemos denominar emancipação. É por isso que uma cultura em e para os direitos humanos se faz com base na democracia, no respeito às nossas diferenças e na vivência cotidiana de nossos direitos. E a emancipação só virá acompanhada pela educação. Já disse Paulo Freire que “se a educação sozinha não transforma o mundo, sem ela nenhuma transformação acontecerá”.

Ações educativas verdadeiras apontam o caminho para que as palavras tomem assento na vida de cada um e cada uma de nós. Como diz Cecília Meireles “as palavras precisam pousar”. Elas precisam encontrar âncoras para seu pouso, pois “palavras voam, às vezes pousam”. Nem todas as palavras precisam pousar, interessa que pousem aquelas capazes de nos ensinar a viver melhor.

Sempre é tempo de aprender desaprendendo. Desaprender racionalidade para entender emoções e sentimentos. Desaprender preconceitos para construir conceitos mais significantes. Desaprender quem somos para perceber que sempre somos um quase-eu. Desfazer racionalidades para gentificar-se, através das nossas relações de amorosidade. Desaprender falar, para aprender a ouvir, no silêncio e na solidão de cada um.

Eduardo Galeano, em seu poema O Mundo, desafia a cada um e cada uma de nós, na sua condição de

sujeitos de sua história e de seres, na sua diferença. Conta em seu livro, “O livro dos abraços”, que “um homem da aldeia de Neguá, no litoral da Colômbia, conseguiu subir aos céus. Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida humana. E disse que somos um mar de fogueirinhas. - O mundo é isso – revelou. Um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo”.

Nossa fome de saber deve traduzir-se, na prática, como busca para transformar ideias em ações. Ações em favor da humanidade que existe em cada um, em nós e em todo mundo. A nossa fome de saber é, igualmente, fome de humanidade. E o segredo de conhecer está muito ligado à necessidade de conviver. O egoísmo de não conviver gera a incompreensão de nós mesmos e dos outros. E diminui as oportunidades de felicidade, matando o desejo latente de vida, vida que morre quando não é compartilhada

*Nei Alberto Pies é professor e ativista em direitos humanos.
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EDITORIAL

O papa consulta os cristãos da base

Helio Amorim

A iniciativa é inédita e surpreendente. A consulta circula mundo afora, com 39 perguntas, em sete idiomas. O tema é a família, seus problemas e esperanças, os questionamentos que circulam pelo mundo e exigem revisão de normas e posturas eclesiásticas para que prevaleça a caridade e o bom senso, mediante a compreensão da realidade humana, - pessoal, familiar e social, com visão nova.

Com a ajuda das ciências humanas e da pesquisa teológica, a Igreja vai revendo e reformulando velhas concepções e interpretações da vontade de Deus, revisando suas doutrinas, reformulando seus ensinamentos, modificando suas práticas, revogando proibições e punições - e pedindo perdão, como fez João Paulo II no início do seu papado, há três décadas. Em suma, submetendo-se à inspiração divina sempre presente, mas à qual tantas vezes a Igreja terá se fechado, ao longo dos tempos.

A postura repressora do passado ainda se abate sobre teólogos e leigos que contestam questões mal resolvidas na vida da Igreja. O celibato forçado dos sacerdotes, o casamento religioso, a participação na eucaristia e o reconhecimento da possível sacramentalidade da união de divorciados que voltam a se casar, o uso de contraceptivos que não aqueles equivocadamente chamados métodos naturais e outras orientações ou normas canônicas e pastorais que continuam sendo tratadas como questões fechadas e assim não admitem discussões, não obstante a inconsistência das bases teológicas que as sustentam.

Frente a esses questionamentos, a única reação da autoridade religiosa, em qualquer nível, sempre foi, ainda no passado recente, a ameaça de condenação, os expurgos, proibições de ensinar ou mesmo de falar em espaços controlados pela Igreja - nunca a análise franca e desarmada de argumentos e proposições inovadoras.

Seria interessante recordar, entretanto, o muito que tem mudado nas doutrinas e práticas da Igreja, não apenas nas grandes mudanças ocorridas ao longo de séculos, mas nos tempos de uma vida. Os mais idosos vão se recordar das normas e disciplinas que lhes eram impostas e ensinadas em sua adolescência e juventude, nos excelentes colégios católicos que frequentaram, e que não sobreviveram a duas gerações.

Assim, permaneceremos abertos ao muito que seguirá mudando nos próximos anos e décadas, permitindo-nos relativizar as "certezas" de ontem, que hoje já não se impõem. É claro que tudo o que se refere ao amor e à justiça, à humanização e à esperança cristã, à caridade e à solidariedade humana, permanecerá como essência da mensagem evangélica. O resto é dinâmico e evolutivo, criações humanas sob influxo da cultura, entendimentos provisórios, sujeitos a revisões em vista do avanço das ciências e da reflexão teológica que nenhum autoritarismo impedirá.
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Refletindo com Rubem Alves

"O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: "Se eu fosse você". A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção."

Amor é isto: a dialética entre a alegria do encontro e a dor da separação. De alguma forma a gota de chuva aparecerá de novo, o vento permitirá que velejemos de novo, mar afora.
Morte e ressurreição. Na dialética do amor, a própria dialética do divino.
Quem não pode suportar a dor da separação, não está preparado para o amor. Porque o amor é algo que não se tem nunca. É evento de graça.
Aparece quando quer, e só nos resta ficar à espera. E quando ele volta, a alegria volta com ele. E sentimos então que valeu a pena suportar a dor da ausência, pela alegria do reencontro.

"Se fosse ensinar a uma criança a beleza da música não começaria com partituras, notas e pautas.
Ouviríamos juntos as melodias mais gostosas e lhe contaria sobre os instrumentos que fazem a música.
Aí, encantada com a beleza da música, ela mesma me pediria que lhe ensinasse o mistério daquelas bolinhas pretas escritas sobre cinco linhas.

Porque as bolinhas pretas e as cinco linhas são apenas ferramentas para a produção da beleza musical. A experiência da beleza tem de vir antes".


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