“Eu sou o pão da vida” diz Jesus no Evangelho. “Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim, nunca mais terá sede”. Esta promessa é para nós, nós somos os beneficiários, a nós Jesus doa sua vida divina que vence o mal e a morte. Ele é o “enviado do Pai” para realizar esta promessa. E ainda afirma que toda pessoa que vê o Filho e nele crê, quem se reconhece conectado com Jesus graças ao batismo, ligado com Ele pelos sacramentos da Eucaristia, da Penitência e de toda a vida da Igreja, quem O reconhece presente, este tem a vida eterna. E, além disso, o ressuscitará no final de tudo.
A vida eterna de que fala Jesus é uma qualidade nova de vida já aqui nesta terra. Jesus quer doar a nós uma vida que tenha significado e beleza, que valha a pena, para vivermos com gosto e com alegria (a alegria do Evangelho da qual nos fala o Papa Francisco). Jesus repete muitas vezes essa promessa, por exemplo, quando afirma: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10). A grande maioria de nós que agora participamos desta Santa Eucaristia podemos testemunhar que a promessa de Jesus é verdadeira.
O Papa Francisco convocou dois Sínodos, reunindo bispos do mundo inteiro para refletir sobre a família. Ele está preocupado com o mundo atual, que se torna uma babilônia e perde o melhor da vida, perdendo a beleza do amor vivido numa família, constituída por um homem e uma mulher, aberta para gerar filhos e educá-los. E, ao mesmo tempo, o Papa está preocupado com tantas feridas que são produzidas quando o amor é vivido longe do desígnio de Deus.
Em outubro passado, realizou-se o Sínodo Extraordinário e no próximo Outubro haverá o XIV Sínodo ordinário. Todas as comunidades católicas do mundo participaram da preparação, enviando suas contribuições.
Podemos visualizar três grandes tarefas para o Sínodo: 1. Apresentar de maneira renovada o Evangelho da Família, isto é a beleza do amor, caminho para aquela vida em abundância, a vida eterna de que falava o Evangelho de hoje. 2. Enfrentar as feridas, as situações de sofrimento que se criam exatamente pelas maneiras precárias de viver o amor nos dias atuais. 3. Incentivar a dimensão social da família para que possa dialogar com a sociedade, tema não incluindo nos Lineamenta.
Quando acabou de ser criado por Deus, Adão se deparou com a sua solidão originária. Não encontrou nenhum animal que lhe servisse para companhia. Então Deus Disse: “não é bem que o homem esteja só. Vou fazer uma auxiliar que lhe corresponda.” (Gn 2,18).
O ser humano foi pensado por Deus desde o princípio para viver em companhia: “homem e mulher Ele os criou”, diz a Sagrada Escritura, o ser humano tem uma estrutura relacional. A condição para a realização da pessoa é “ser para o outro”. O desejo de felicidade pode encontrar a própria satisfação somente através do outro. No entanto, a diferença sexual foi usada muitas vezes para o homem oprimir a mulher. A Igreja está empenhada em corrigir essa mentalidade antiquada que está sendo superada. Isto não elimina a diferença, mas a supera no respeito e na paridade de direitos e de oportunidades, encontrando novas formas de cooperação entre eles e com as novas gerações.
Em seguida, a Sagrada Escritura nos diz: “Façamos o homem como nossa imagem, como nossa semelhança”. (Gn 1, 26) Para São João Paulo II, o que mais se assemelha à Santíssima Trindade aqui na terra é a família. De fato, na Trindade existe o Pai, existe o Filho e existe o Espírito Santo que é o amor. A dinâmica interna da Trindade é o dom total de si. O Pai se doa ao Filho, o Filho se doa ao Pai e o Espírito é o próprio amor entre os dois. A comunhão entre pessoas imita a Santíssima Trindade e a relação esponsal entre marido e mulher é a mais importante expressão dessa comunhão. A fecundidade, sinal da maturidade humana, encontra aí o seu ambiente mais apropriado e é o fruto deste amor que se doa.
O amor vivido como dom sincero de si é algo grande, que exige algum sacrifício, alguma renúncia. Mas não devemos ter medo disso, pois é a porta estreita que abre o acesso à realização.
Doar a própria vida para o bem e a felicidade de outro não é fácil. Por isso, devemos olhar a Jesus, Ele se doa a nós. São Paulo na carta aos Efésios diz: “Maridos, amai vossas mulheres como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela” (Ef 5, 25). Por isto, são tão importantes os sacramentos do matrimônio e da Eucaristia. Estes tornam presente Jesus: a Eucaristia no pão e vinho consagrados, e o Sacramento do Matrimônio torna presente a morte e a ressurreição de Jesus na vida da família. Por isso, a família é uma pequena Igreja, doméstica. Ele se doa a nós (tomai e comei, isto é meu corpo...), ele abraça o amor e o fortalece, tornando-o capaz de acolhimento e perdão, de fidelidade e dá força para recomeçar.
Mas quando o amor é vivido como um lazer e os vínculos são percebidos não como uma graça, mas como uma amarra, quando é rejeitada a responsabilidades pelo outro e recusa-se a gerar filhos, ou quando o amor é vivido com a fragilidade própria dos afetos, não enraizado em Cristo, mesmo quando as intenções ao casar eram as melhores, o individualismo se infiltra, falta paciência, falta misericórdia, então se criam feridas: separações, divórcios, abandonos, solidão, conflitos e brigas que machucam os adultos e ainda mais as crianças.
Papa Francisco recomenda acompanhar as famílias, acompanhar as pessoas que mais sofrem. A Igreja já disse (na Sacramentum Caritatis) que os divorciados e recasados não estão fora da comunhão eclesial e já indicou as muitas formas como podem participar da vida da Igreja, ainda que não seja possível o acesso à comunhão sacramental.
Não devem ser ignoradas as forças que lutam para desqualificar a família, reduzindo seu significado. Necessitamos nos ajudar para conquistar um olhar mais crítico e usar o poder do dedo para desligar o televisor ou mudar de canal, o poder da palavra para manifestar nossa experiência, para promover uma família consciente do seu valor, uma família cidadã. Para isso vale a pena constituir Associações de Famílias.
A mídia laica tende a empurrar o debate do Sínodo aos polos extremos, apresentando-o como luta entre rigoristas e liberais, como se a problemática fosse apenas o direito dos recasados a receber a eucaristia. Sem descartar esse problema, as situações são muito mais complexas e demandam um grande esforço pastoral para acompanhar casais. O Papa nos recomenta acompanhar as famílias, acompanhar as pessoas que mais sofrem. A Igreja já disse (na Sacramentum Caritatis) que os divorciados e recasados não estão fora da comunhão eclesial e já indicou muitas formas para participar da vida da Igreja, sendo, no entanto, impossível o acesso à comunhão sacramental. Esse tema também, mesmo não sendo central, será discutido no Sínodo.
Abre-se um extraordinário espaço para a Pastoral Familiar e para Movimentos e Novas Comunidades, para testemunhar a beleza e a conveniência da família conforme ao desígnio de Deus, lugar onde as exigências humanas encontram maior correspondência.
A todas as famílias que nos acompanham, recomendamos: convidem Jesus e Maria para que tomem parte de sua vida de família, como fizera o casal de Canaã. E assim, quando faltar o vinho, quando a alegria e o gosto de conviver desaparecem, a Virgem Maria poderá dizer a Jesus: falta o Vinho. E a nós ela diz: Façam tudo o que Ele vos disser. E poderemos, então, presenciar o milagre de uma vida de família que cresce e vai renovando-se na paz e na abundância que Jesus deseja para nós, para que tenhamos a vida eterna. Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
Dom João Carlos Petrini
Bispo de Camaçari (BA)
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