Vimos um arrastão...
As aparências enganam, afirma o ditado popular. E realmente não se pode ficar apenas no que os sentidos captam, muito embora também seja verdade que “o que os olhos não veem o coração não sente”. Alguém “pediu licença para entrar pelos corações”, conquistando o que já podia “ser sentido a olhos vistos”.
Na Igreja atual se vê e se sente a iminente quebra de paradigmas já pela fuga de protocolos por parte do Papa Francisco. O “estilo inusitado” encanta multidões, numa pós-modernidade que rejeita formalidade. Olhos veem, corações sentem. Na aparência de frases simples, a Palavra de Deus atinge “o coração humano” (Dt 30,14). E ele consegue arrastar. Palavras comovem, exemplos arrastam.
Conhecedor do “fim do mundo”, onde os príncipes da Igreja o buscaram, mandou “sentir o cheiro da ovelha”. Francisco, o Papa, cita frases “muito a ver com o povo”. Fantásticas, as afirmações de que no Brasil se acolhe “colocando mais água no feijão” ou que “queria tomar um café e não uma cachaça”. A gente simples se identifica com quem lhes fala de modo inteligível, ao contrário dos paradigmas danosos que formam pregadores melindrosos. E lá vem o Papa com seu humor e sinceridade!
Antônio Vieira, padre dos Sermões, já era adepto do “ridendo castigat mores” (rindo, castigam-se os costumes). Talvez rebuscado para a atualidade, mas não na genialidade. Leia-se o famoso Sermão de Santo Antônio aos Peixes, tão adaptado à realidade (Recomendo-o aos “chefes” do povo).
“A boca fala do que o coração está cheio” (Mt 12,34). Francisco tem falado, tem expressado de forma empolgante como sugerem os Documentos da Igreja. Vai de encontro às pessoas: a Palavra revelada e o Magistério da Igreja não podem ficar apenas no papel, mas precisam cumprir seu papel. Sua Santidade mostra como necessidade competência e humanidade.
Junto à mudança de paradigmas e quebra de protocolos anda a quebra de caricatura: Santidade é para todos! O Papa do Milênio, Beato João Paulo II, com carisma invejável rasgou o véu do templo. Digo, matou velhas ideias e rasgou até mesmo a Cortina de Ferro. Beatificou e canonizou. À vontade brindou a Igreja com figuras exemplares, propondo modelos da Vocação Universal à Santidade conforme o Concílio Vaticano II. “O santo súbito” já detonara velhos protocolos, reforçando ideais e esbanjando bom humor: “Se Deus é brasileiro, o Papa é carioca. Em Porto Alegre dizem papa gaúcho!” Como esquecer dele “rodando a bengala” em sua visita ao Brasil?
E agora vem Francisco, jeito novo de anunciar a Boa-Nova, depois do grande teólogo Bento XVI. Aquele que surpreendeu o mundo com sua humildade percebeu que suas forças o impediriam de continuar no comando da premente “Nova Evangelização”. Comovente, sua vontade de “daqui para a frente dedicar-se à Igreja em uma vida de oração”. Aliás, algo que aliado ao bom humor cabe muito bem à vida de quem afirma querer anunciar a Palavra: falar com Deus. Simplesmente Rezar! Fácil é fixar-se em cargos, prender-se a gostos, sustentar caprichos, esboçar caricaturas e mantê-las. Difícil é orar e “adorar ao Pai em espírito e verdade como Ele deseja” (Jo 4,23).
Igreja, “mãe que abraça, acolhe e acaricia”, precisa estar presente. Viver a Palavra não é ser estático e quietinho. Não apenas monges que no silêncio “rezam e trabalham” como aconselhou São Bento (Ora et Labora); ou unicamente os demais consagrados e consagradas a Deus são chamados à santidade. Todos indistintamente precisam promover justiça e paz. Cada pessoa, reconhecendo-se parte do todo, pode renovar sua vocação. Virtuosos exemplos: Bento XVI na oração e Francisco na empolgação. O que renunciou ao Pontificado e o que assumiu a Diocese de Roma demonstram não se prender a comportar-se em esquemas meramente humanos ou alheios à vontade de Deus. Vão além das expectativas. Adeus pensar que “o papa não deve renunciar”. Tchau ao clichê “novo papa deve ser bem comportadinho”. Os sucessores de Pedro, pela vida que levam, inspiram a testemunhar o que creem: a Palavra que precisa “chegar aos confins do universo” (Mc 16,15).
Excelente impelir católicos à identificação com o Deus Justo e Santo. O mundo contemporâneo não quer “santinhos do pau oco”. Cada qual pode ser melhor onde, quando e como quiser. Basta boa vontade! E o argentino feito Papa, que foi capaz de frisar que “Deus é brasileiro”, tem ajudado muitos a compreender “que a Palavra se fez carne e habitou entre nós!” (Jo 1,14). Vimos um “arrastão”. Deixemo-nos levar pelo bom exemplo para viver a Palavra da Bíblia e da Tradição. Viva o Papa!
Padre Fabiano Dias Pinto
Reitor do Seminário São José
Coordenador do Clero Diocesano
Nenhum comentário:
Postar um comentário